Tamara da Silva
Cidadania não é uma questão de persuasão ou opção puramente racional entre virtude e pecado. Ela é vivida como necessidade do eu, como desejo. Mesmo quando agimos em torno do bem comum, a atividade implica em motivação individual: ninguém é movido por interesses universais e abstratos e não se pode pedir ao homem que abandone a esfera pessoal de busca da felicidade, mas deve impedir que esta busca cerceie a dos outros.
A democracia é a tentativa constante de regeneração de suas definitivas imperfeições por meio de um processo de aperfeiçoamento permanente, razão pela qual é o sistema superior de organização da sociedade. “Onde quer que seja, existirão sempre homens e mulheres, grupos e indivíduos singulares, minorias e camadas particulares, submetidos a algum tipo de humilhação, degradação, injustiça ou opressão” Marco Aurélio Nogueira .
Cidadania diz respeito ao cidadão, ou seja, habitante da cidade, o mesmo que polis, na Grécia antiga. A palavra polis também gerou em português a palavra "política" tão conhecida e que por vezes adquire um sentido pejorativo, pois ao inverso do que ela postula, é usada para beneficiar o interesse particular sobre o público. O conceito de cidadania não teve sua gênese no Estado Moderno. Em Roma, por exemplo, era um estatuto unitário do qual desencadeava-se a igualdade de direitos entre os cidadãos. Entretanto, é inquestionável ter a Grécia, alcançado de forma mais ampla seu sentido através da participação dos cidadãos atenienses nas assembléias do povo, tomando efetivamente decisões políticas.
Mas ser cidadão é ter acesso à decisão política, ser um possível governante, um homem político. Ter direito não apenas a eleger representantes, mas a participar diretamente na condução dos negócios da cidade. É verdade que em Roma nunca houve um regime verdadeiramente democrático. Mas na Grécia os cidadãos atenienses participavam das assembléias do povo, tinham plena liberdade de palavra e votavam as leis que governavam a cidade - a Polis - tomando decisões políticas.
Na Antiguidade, o homem era um ser sem direitos, por oposição ao cidadão. Na era moderna, o homem é sujeito de direitos não apenas como cidadão, mas também como homem.
O princípio da cidadania moderna fundado sobre a idéia de humanidade enfrentou muitas dificuldades de aplicação. A primeira se refere ao tamanho das repúblicas modernas que impede o exercício direto do poder pelo cidadão. O Estado se destaca da sociedade civil, o poder não pode mais ser exercido por todos. Para evitar o despotismo, o princípio republicano consagra a idéia do controle popular pelo sufrágio universal, inspirando-se na visão de soberania popular defendida por Rousseau.
Pela doutrina da representação fundada sobre a soberania popular, a origem e o fim de toda a soberania se encontra no povo. O cidadão não pode mais exercer em pessoa o poder, mas escolhe por seu voto seus representantes. Este princípio se universalizou, mas sofreu alguns períodos de exceção. Uma das exceções mais conhecidas é a chamada democracia censitária, reservada aos proprietários. O escritor francês Benjamin Constant afirmava em 1815 que somente o lazer, assegurado pela propriedade, permitia adquirir sabedoria: Segundo ele, “somente a propriedade torna os homens capazes do exercício do direito político”. Ou seja, a classe trabalhadora podia morrer pela pátria, mas não podia oferecer seus homens para a representação política que, para ele, deveria basear-se não na consciência ou dignidade, mas no critério anti-democrático da competência. Benjamin Constant opunha a “liberdade dos antigos”, fundada nos direitos políticos da cidadania, à “liberdade dos modernos” que, segundo ele, se explicaria pelos direitos civis do indivíduo.
Outra dificuldade na aplicação da cidadania moderna diz respeito ao conceito de homem e sua natureza. A república moderna demorou muito tempo a admitir que a pessoa humana é dupla, compreende o homem e a mulher. De um modo geral, foi somente no século XX que o sufrágio universal se estendeu às mulheres.
A cidadania, definida pelos princípios da democracia, se constitui na criação de espaços sociais de luta (movimentos sociais) e na definição de instituições permanentes para a expressão política (partidos, órgãos públicos), significando necessariamente conquista e consolidação social e política. A cidadania passiva, outorgada pelo Estado, se diferencia da cidadania ativa em que o cidadão, portador de direitos e deveres, é essencialmente criador de direitos para abrir novos espaços de participação política.
Porém, é importante a concepção da cidadania como um processo político, social e histórico, que se constrói a partir de ambas as dimensões, individual e coletiva. O Estado, por sua vez, na forma como se organiza, tendo em vista uma cidadania melhor, acaba por propor e criar políticas sociais que não levam em conta o cotidiano e a construção de uma cidadania crítica, participativa e de qualidade.
Sabe-se que o problema da desigualdade é um componente histórico-estrutural, que perfaz a própria dinâmica da resistência e da mudança, pois, o capitalismo representa uma sociedade de discriminação. O que se quer são formas mais democráticas, políticas sociais que reduzam o espectro da desigualdade e da desconcentração de renda e poder. O Estado pode ser um eqüalizador de oportunidades, desde que defina, não o seu tamanho ou presença, mas a quem serve.
Numa sociedade marcada pela desigualdade social, da distribuição da renda e dos benefícios sociais, para todo cidadão consciente a participação é também um dever. A participação no processo político se restringe ao exercício do voto, à militância em um partido político, num grupo, em comícios ou na discussão de temas políticos com os amigos, colegas e vizinhos. A participação vai, além disso.
A democracia caracterizou-se em seu início pela participação direta. Por outro lado, os meios de comunicação moderna, com a informática e a rede mundial de comunicação (Internet) oferecem recursos que permitem a melhor inserção do cidadão do nosso tempo na vida política, permitindo que cada um possa dar a sua contribuição para o aperfeiçoamento da democracia. Se a democracia é uma tenra plantinha, como dizia Otávio Mangabeira, cabe a todo cidadão consciente dar a sua contribuição para que esta plantinha se desenvolva, cresça sadia até que se tornar uma árvore frondosa, suficiente para abrigar todas as idéias e correntes de opinião.
Democracia no sentido original significa uma doutrina política ou forma de governo baseada na soberania do cidadão, no seu acesso à cena pública, na pluralidade de idéias e expressão de suas opiniões, na possibilidade de intervir politicamente. Enfim, a democracia aceita em seus próprios princípios, o aparecimento do imprevisível e da livre atuação política de seus cidadãos. A democracia admite, nem todos são iguais. A oportunidade igual em opinar não elimina o próprio direito a diferença entre as pessoas.
Ora, a democracia não é apenas um regime político com partidos e eleições livres. É, sobretudo uma forma de existência social. Democrática é uma sociedade aberta, que permite sempre a criação de novos direitos. Os movimentos sociais, nas suas lutas, transformaram os direitos declarados formalmente em direitos reais. As lutas pela liberdade e igualdade ampliaram os direitos civis e políticos da cidadania, criaram os direitos sociais, os direitos das chamadas “minorias” - mulheres, crianças, idosos, minorias étnicas e sexuais - e, pelas lutas ecológicas, o direito ao meio ambiente sadio.
Os valores da liberdade e da igualdade são essenciais ao conceito de democracia. Em outro passo, mostra-se indispensável que a tomada de decisão, em que prevalece sempre a vontade da maioria, não se torne um instrumento de opressão contra as vozes discordantes. Numa autêntica democracia, as minorias vêem suas prerrogativas respeitadas, não é uma ditadura da maioria.
CONCLUSÃO
Após todas as análises apresentadas, concluímos que as contradições presentes no processo de cidadania, no que tange as relações entre Estado e Sociedade estão implícitas nas políticas sociais que, se por um lado, visam resolver os problemas sociais, como a fome, o analfabetismo e a miséria, por outro, são assistencialistas, incluem a tutela, mascarando as discriminações, e não atingindo o cerne do problema.
Concretizam-se, portanto, como desmobilizadoras e controladoras, o que tolhe a verdadeira participação, o desenvolvimento da autonomia e emancipação dos indivíduos.
O Estado propõe ao indivíduo uma situação de direito, que ele próprio não consegue incorporar e absorver. A racionalidade dominante, nesta relação, gerada por uma forma de poder, estabelece a desigualdade entre indivíduos e Estado.
Assim, a cidadania vem sendo construída a partir de movimentos sociais, desvinculados do Estado.
Em nosso país há os que são mais cidadãos, os que são menos cidadãos e os que nem mesmo ainda são. Pois o cidadão deve ser multidimensional, onde cada dimensão se articula com as demais na procura de um sentido para a vida, de uma nova sensibilidade. As contradições fazem do país um contexto de desigualdade e subdesenvolvimento que explicitam-se nas mais diversas problemáticas conjunturais.
Já democracia no nosso país ainda estar por ser inventada, por democracia entendem-se a existência de eleições, de partidos políticos e da divisão republicana dos três poderes, além da liberdade de pensamento e de expressão. Em lugar de democracia, temos instituições vindas dela, mas operando de modo autoritário.
Bibliografia:
Folha: A sociedade Democrática – Marilena Chauí
www.cidadania.com.br
Disponível em: http://www.recantodasletras.com.br/textosjuridicos/1136946
Acesso em 12/03/2012
Postado por Cecília Umbelina Roza
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